quinta-feira, 9 de outubro de 2014

SP imita FBI para cadastrar digitais de 6 milhões de criminosos desde 1900

Polícia comprou programa de R$ 30 milhões para digitalizar impressões.
As fichas criminais vão de Chico Picadinho a Roger Abdelmassih.

Roger Abdelmassih, Suzane Richtfhofen, Alexandre Nardoni, Cadu, Bandido da Luz Vermelha e Gino Meneghetti estão entre os 6 milhões de criminosos que terão as digitais cadastradas num programa de computador identico ao do FBI e que será usado pela Polícia Civil de São Paulo (Foto: Fotomontagem: Victor Moriyama e Kleber Tomaz / G1)

A Polícia Civil de São Paulo está usando o mesmo método de identificação digital adotado pelo FBI (Federal Bureau of Investigation ou Agência Federal de Investigação dos Estados Unidos) para recuperar, cadastrar e arquivar num computador impressões dos dedos que 6 milhões de criminosos deixaram em papéis amarelados desde o início do século 20, quando começaram a ser fichados no estado.
A digitalização dos documentos criminais começou a ser feita em setembro pelo Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt (IIRGD), da polícia. A estimativa de término é de seis meses. O objetivo é abastecer um banco de dados da papiloscopia policial (área responsável por analisar e comparar digitais) para dar mais celeridade às investigações e ajudar na elucidação de crimes em São Paulo.
Um programa de computador, no mesmo molde do usado pelo FBI, deverá aposentar 24 bancadas de madeira laranja, chamadas de aparelhos de pesquisa decadactilar. Sob os cuidados do IIRGD, no centro da capital paulista, elas ainda guardam todas as fichas criminais do estado do começo dos anos de 1900. O G1 visitou o local neste mês.

Adquirido em fevereiro deste ano pelo governo paulista por R$ 30 milhões – num pacote que inclui também a modernização do registro geral (RG) –, o software Afis (Automated Fingerprint Identification System ou Sistema de Identificação Automatizada de Impressões Digitais) leva menos de um minuto para informar se uma digital suspeita pertence a um criminoso fichado na sua base de dados. Pelo método tradicional, consultando ficha por ficha das bancadas, esse trabalho pode levar até 3 horas.
Como é: bancadas de madeira

Introduzidas na década de 1940, as bancadas já começaram a ser desativadas. Treze delas já podem virar peças de museu. As demais continuam funcionando. Elas guardam o acervo histórico do instituto, dos primeiros aos últimos criminosos.
As mesas de madeira têm desde as digitais do italiano Gino Meneghetti, famoso ladrão de casas de 1914 a 1968, passando pelas de Chico Picadinho, que em 1966 esquartejou uma bailarina estrangeira, até as impressões dos dez dedos do ex-médico Roger Abdelmassih, preso em agosto, condenado a 278 anos por estupros.
“Nós temos aqui 37 máquinas que abrigam prontuários criminais. E cerca de 6 milhões de pessoas que foram indiciadas em inquéritos policiais ficam nesses arquivos”, disse o delegado Roberto Avino, diretor do IIRGD.

Mesa de trabalho de papiloscopista que será substituída por programa de computador (Foto: Victor Moriyama / G1)

“Essas 37 máquinas sumirão do instituto. Estamos digitalizando os prontuários dentro delas, que são fichas criminais desde 1902. Tem dados de criminosos como Chico Picadinho até esse último, de criminosos de cunho internacional, como [Roger] Abdelmassih”, completou Avino.
Feitos com válvulas e movidos a manivelas, os aparelhos de pesquisa decadactilar são operados por papiloscopistas policiais, que acionam botões para girar um cilindro repleto de fichários com digitais de criminosos. A função desses profissionais consiste em comparar essas impressões cadastradas com suspeitos de crimes, cadáveres não identificados e pessoas desconhecidas.
O trabalho ainda é arcaico. Os papiloscopistas usam uma lupa para checar as marcações das digitais nas papeletas. Apesar de cada digital ser única e não haver duas iguais, o estudo da datiloscopia do início do século 20 mostrou que existem alguns padrões. A partir disso, as digitais são separadas em grupos. A Scotland Yard (polícia de Londres) foi uma das primeiras polícias no mundo a adotar o sistema.
“A maior satisfação é quando identificamos um cadáver carbonizado a partir da sua digital”, disse a papiloscopista Edna Keiko, que, assim como os demais colegas de trabalho, irá trocar os aparelhos de pesquisa decadactilar pelo computador.
Como será: computadores
Testes no Afis demonstraram a eficácia do programa de computador em identificar uma digital. “O Afis usado em São Paulo é praticamente o mesmo modelo adotado pelo FBI nos Estados Unidos”, disse o delegado José Brandini Jr., do IIRGD.
A resposta do software é mais rápida do que a leitura sobre a explicação que ele faz nos dois parágrafos abaixo:

Programa digitalizará impressões de 6 milhões de criminosos; no computador busca demora segundos (Foto: Victor Moriyama / G1)

Um fragmento da marca dos dedos de um suspeito não identificado foi colhido numa cena de crime em Araraquara, interior de São Paulo. Depois, foi enviado para confronto ao núcleo de papiloscopia policial, na capital. Ali, a amostra acabou escaneada e lançada no computador.
O programa então faz as marcações datiloscópicas da digital e a compara com seu banco de dados criminal. Em segundos, aparece um ranking com sugestões de possíveis donos da impressão deixada na cena do crime no interior. Conclusão: o suspeito é um criminoso procurado e reincidente. Para não atrapalhar a investigação da Polícia Civil, que recebeu a informação, o nome dele não será divulgado.
“Basicamente é isso: a gente recebeu um conjunto de digitais do IML, de um cadáver que foi encontrado sem identificação e, a partir desse momento, ele busca no banco de dados e ele me oferece candidatos, quem pode ser essa pessoa”, disse a papiloscopista Lilian Buzetto, que trabalha com o Afis.

Necropapiloscopista Elizabete Ushida Azevedo exibe dedo polegar em pote (Foto: Kleber Tomaz / G1)

Casos
A identificação de que um pedaço incompleto de digital numa lata de cerveja era de Chorão ajudou a polícia a concluir que o cantor da Banda Charlie Brown estava sozinho no apartamento quando morreu em 2013 após overdose de cocaína.
As digitais de Sandro Dota achadas num saco plástico usado para asfixiar a adolescente Bianca Consoli incriminaram o motoboy pelo assassinato da cunhada em 2011.
Em 1992, todos os 111 mortos no massacre do Carandiru foram identificados pelo IIRGD.
Mas em alguns casos, quando o corpo humano está em avançado estado de decomposição do corpo humano ou foi carbonizado, a identificação é feita diretamente nos dedos. Isso mesmo, as falanges (ossos quer formam os dedos) são arrancadas e levadas para o IIRGR. Lá, os restos mortais são acondicionados em soluções químicas e preservados em potes num laboratório refrigerado.
Foi o que ocorreu em 2010, quando os dedos de Mércia Nakashima foram levados ao setor de necropapiloscopia para confirmar a identidade da advogada morta pelo ex-namorado.
Mesmo procedimento foi adotado para parte dos 199 cadáveres da queda de um avião em Congonhas. “Esse trabalho, ele ajudou a identificar 35 das 48 vítimas do acidente aéreo da TAM que ocorreu em 2007”, afirmou o necropapiloscopista Edison Campos de Paula.
Incidente parecido em 1996 levou os dedos dos integrantes do Mamonas Assassinas, mortos após queda de aeronave, para o laboratório do instituto.
Três das seis mulheres mortas pelo Maníaco do Parque em 1998 também foram identificadas por meio dos dedos arrancados das vítimas.
Os papiloscopistas que trabalham no IIRGD são vinculados à Polícia Civil e não a Superintendência da Polícia Técnico-Científica, como os peritos. Um projeto de lei enviado ao Senado propõe, no entanto, a inclusão dos papiloscopistas policiais como papiloscopistas periciais.

De acordo com eles, seria uma maneira de reconhecer a categoria de papiloscopista como perito. “Já ajudamos a esclarecer vários crimes e casos de repercussão em São Paulo”, disse o papiloscopista Paulo Prates, diretor do Setor de Controles das Unidades de Identificação (Secui). "E quando esclareceremos isso somos confundidos com os peritos. Quase ninguém reconhece que esse trabalho foi feito por papiloscopistas".

Arquivos com fichas para RGs empilhados em caixas (Foto: Victor Moriyama / G1)

Papel acumulado
Mesmo diante do incremento tecnológico para substituir as pesquisas no papel pelas da tela do computador, o IIRGD não poderá se livrar dos arquivos físicos. Segundo o instituto, a Justiça determina que o acervo com fichários continue sendo arquivado para, se um dia houver necessidade, se pedir uma contraprova do material.
“Não há mais espaço físico para acomodar os papéis com digitais e fichas”, disse o analista de sistemas Mario Abud, que trabalha na Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo (Prodesp) no prédio do IIRGD.
“Sempre há o risco de incêndio. Imagine se pegar fogo e todo esse material for consumido pelas chamas”, alertou o papiloscopista Andres Luiz Pessoa. “É por isso que sempre há um extintor perto dos arquivos”.

Além das fichas criminais, onde estão as digitais e informações dos registros gerais de criminosos, o IIRGD também arquiva RGs de cidadãos comuns – mais de 58 milhões de registros em fichários de papel. Esse material também será digitalizado na base Afis. Até este mês haviam sido cadastradas 1,2 milhão de pessoas civis que fizeram o novo RG.
A nova carteira de identidade digitalizada do estado de São Paulo começou a ser impressa em fevereiro. O delegado geral Luiz Maurício Souza Blazeck disse à época que ela tem nove itens de segurança para evitar fraudes, entre elas o QR Code, um código em 2D impresso no verso do RG que armazena todos os dados da pessoa e pode ser escaneado por um policial para que se comprove a autenticidade do documento.
As impressões digitais de quem tem o novo RG também já serão automaticamente cadastradas no banco de dados do Afis. No RG antigo, a identificação é pela foto. O modelo anterior continua valendo e apenas quem precisar emitir uma nova via ou quem tirar pela primeira vez terá a nova versão.

fonte:http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/10/sp-imita-fbi-para-cadastrar-digitais-de-6-milhoes-de-criminosos-desde-1900.html
Kleber Tomaz - Do G1 São Paulo
Este site não produz e não tem fins lucrativos sobre qualquer uma das informações nele publicadas, funcionando apenas como mecanismo automático que "ecoa" notícias já existentes. Não nos responsabilizamos por qualquer texto aqui veiculado.
Faça a sua pesquisa
http://www.facebook.com/profile.php?id=100001544474142

Nenhum comentário:

Postar um comentário